Música, amusia congénita e dificuldades socioemocionais
- o pátio - comunidade
- 24 de abr. de 2018
- 2 min de leitura
A maioria dos seres humanos tem uma predisposição natural para a música desde o início da vida, reflectida desde o gosto por atividades quotidianas com música, à especialização cerebral para sons musicais. Assim, a música não é apenas uma atividade sociocultural e artística, mas também uma competência cognitiva complexa. Nesta temática, abordamos o modo como a amusia congénita, uma perturbação ao nível musical, se relaciona com dificuldades de processamento socioemocional.

1. A amusia congénita, ou "surdez tonal", é uma perturbação do desenvolvimento que consiste num défice específico no processamento cognitivo musical, existente desde o nascimento, e que afecta não só a forma como os indivíduos percepcionam e distinguem os tons musicais, como a memória e o reconhecimento musical (1, 6, 7).
2. Ao nível do processamento emocional, estudos têm demonstrado que indivíduos com amusia congénita revelam um reconhecimento reduzido de emoções na expressão vocal, quer ao nível verbal (prosódia) como não verbal, bem como ao nível das expressões faciais (5). Além disso, em certos idiomas onde palavras idênticas têm significados distintos consoante o tom, como a língua chinesa, a amusia pode conduzir a dificuldades na fala e em compreender a linguagem.
3. As dificuldades de reconhecimento emocional em expressões faciais, encontradas nestes indivíduos, sugerem que perturbações ao nível dos processos cognitivos superiores, como é exemplo a amusia, podem afetar e limitar algumas competências socioemocionais, tais como a sensibilidade a emoções autênticas (5).
4. Por outro lado, diversos estudos têm demonstrado que o treino musical contribui para o desenvolvimento de competências socioemocionais, tais como o autocontrolo, a autorregulação, a autoestima, a liderança, a empatia e a inteligência emocional (3, 4).
5. Ainda que não seja conhecido um tratamento ou cura, estudos têm mostrado que técnicas de diferenciação tonal e de reabilitação cognitiva da amusia têm algum sucesso nos indivíduos com esta perturbação, sobretudo em crianças (2, 8).
Referências bibliográficas:
(1) Andrade, P. E., & Bhattacharya, J. (2003). Brain tuned to music. Journal of the Royal Society of Medicine, 96, 284-287.
(2) Ayotte, J., Peretz, I., & Hyde, K. (2002). Congenital amusia: A group study of adults afflicted with a music‐specific disorder, Brain, 125(2), 238–251. doi: 10.1093/brain/awf028
(3) Gerry, D., Unrau, A., & Trainor, L. J. (2012). Active music classes in infancy enhance musical, communicative and social development. Developmental Science, 15(3), 398-407.
(4) Kirschner, S. & Tomasello, M. (2010). Joint music-making promotes prosocial behavior in 4-year-old children. Evolution and Human Behavior, 31, 354-364.
(5) Lima, C. F., Brancatisano, O., Fancourt, A., Müllensiefen, D., Scott, S. K., Warren, J. D., & Stewart, L. (2016). Impaired socio-emotional processing in a developmental music disorder. Scientific Reports, 6, 34911.
(6) Pearce, J. M. S. (2005). Selected Observations on Amusia. European Neurology, 54, 145-148. doi: 10.1159/000089606
(7) Peretz, I. (2003). Brain specialization for music: New evidence from congenital amusia. In I. Peretz & R. Zatorre (Orgs.), The Cognitive Neuroscience of Music (pp. 192-203). Oxford: Oxford University Press.
(8) Weill-Chounlamountry, A., Soyez-Gayout L., Tessier, C., & Pradat-Diehl P. (2008). Cognitive rehabilitation of amusia. Ann Readapt Med Phys, 51(5), 332-41. doi: 10.1016/j.annrmp.2008.03.005
Comments