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O inferno serão os outros?

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    o pátio - comunidade
  • 26 de nov. de 2017
  • 2 min de leitura

Atualizado: 1 de dez. de 2017

O trauma constitui um desafio bastante atual na nossa sociedade, seja pela exposição a catástrofes naturais, seja pelo terrorismo que tem absorvido grande parte do que é uma vida em segurança. Será que a épica frase de Jean-Paul Sartre, “O inferno são os outros”, faz tanto sentido como se pensa?

Fazer face a acontecimentos desta natureza exige esforços, e por vezes são nos apresentados cenários de tal maneira dantescos que se considera que a melhor forma de fazer face a este, é pensar: que não volte a acontecer. Contudo, muitas das vezes esquece-se de uma personagem essencial ao desenrolar desta ação – o próprio sujeito e os recursos que este tem para responder ao estímulo stressante. Começo por referir que, quando a resposta a um acontecimento stressante pode não ser a mais adequada, ao longo do tempo, podem-se ir despoletando um conjunto de sintomas – sintomas traumáticos. Estes incluem desde lembranças intrusivas do acontecimento no estado de vigília ou durante o sonho, à ocorrência de flashbacks, alterações de humor ou uma sensação de estranheza ou de desligamento para com os outros, entre outros sintomas produtores de um intenso mal-estar no sujeito. Num estudo realizado com vítimas de acidentes de viação, morte violenta de alguém significativo, combates militares ou ataques terroristas e abusos físicos ou sexuais (Weinberg & Gil, 2016), verificou-se que estas tinham tendência a desenvolver sintomas traumáticos quando apresentavam uma perceção de ameaça exacerbada perante o acontecimento. Mais ainda, esta perceção estaria associada a características de personalidade do sujeito.

Outro estudo realizado com combatentes de guerra mostrou que estes só desenvolviam sintomas traumáticos perante acontecimentos de menos stress (Engelhard & van den Hout, 2007). A maioria dos sujeitos que haviam experienciado acontecimentos com níveis elevados e muito elevados de stress não mostravam um nível mais elevado de desenvolvimento de sintomatologia traumática (Dohrenwend et al., 2006). Isto também seria moderado pelas características de personalidade dos sujeitos. Assim, o que se verificou nos estudos apresentados foi que, sujeitos mais neuróticos, com uma extrema suscetibilidade à experiência de emoções negativas (American Psychiatric Association, 2014), apresentam uma maior tendência para a recordação mais frequente dos aspetos negativos do evento e para o evitamento de emoções e pensamentos dolorosos aquando e após o acontecimento. Isto impossibilitaria o decorrer de uma forma adequada de lidar com acontecimentos stressantes, aumentando o risco de desenvolverem sintomas traumáticos.

Depois disto, pode-se entender que talvez o inferno não sejam só os outros, nós próprios possuímos recursos internos que podem auxiliar-nos ou prejudicar-nos na forma como enfrentamos situações mais adversas. A boa notícia é que, embora mais ou menos estável, a personalidade é flexível e vai-se moldando às experiências que o sujeito vai tendo ao longo da sua vida. Alterar os nossos padrões de pensamento e de comportamento é algo que vai sempre a tempo, ainda mais quando se procura a ajuda especializada para tal. Então, se “o inferno são os outros”, nós somos os “outros” com um inferno que se pode transformar em algo mais próximo do “paraíso”.

 
 
 

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